some minds (don't) work in mysterious ways

há mentes que funcionam de formas misteriosas. mentes que não conseguimos acompanhar pelas mais variadas razões. diferenças na velocidade de processamento é a razão mais comum, mas há outras. há mentes que não compreendemos porque os princípios básicos das suas programações são diferentes dos nossos. há mentes que não compreendemos porque utilizam uma maior percentagem de neurónios do que nós e vice-versa. cada um com a sua e cabe-nos apenas aceitar ou não as diferenças e aprender ou não a viver com elas.

o texto que escrevi no parágrafo anterior refere-se unicamente a mentes que funcionam de forma saudável. mais ou menos rápida, mais ou menos complexa, mais ou menos normal. depois há a outras mentes...

lembram-se disto? pois bem, na altura fiquei genuinamente confusa. não conseguia encontrar um encadeamento de acontecimentos que me fizesse compreender alguma daquelas afirmações. confesso que lancei uns "não deve bater bem da bola..." e "tá maluquinho, só pode!" boca fora, sem ter a mínima noção da gravidade da situação.
o rapaz, de um dia para o outro, passou a olhar através de mim, como se eu fosse transparente. saudava-me, como mandam as regras da boa educação, mas como faria com um qualquer estranho mal cheiroso com quem se cruzasse na rua. olhava-me com desprezo, como quem diz "mantém a distância que eu mordo!!". eu não conseguia compreender mas, talvez a adivinhar o futuro, nem me preocupei em fazer perguntas.

ninguém é obrigado a falar comigo, mas gosto de saber as razões que levam as pessoas a ignorar-me. neste caso não fiquei a saber. era qualquer coisa que se prendia com julgamento por indivíduos em conflito de interesses, com intrigas, com abordagens impróprias e constantes indirectas. era qualquer coisa que me estava a passar completamente ao lado e quando o cenário passa de rainbows and butterflies para thunderstorm lightning de agora para agora, sem sequer me ter saltado um bocadinho do verniz, eu acho mais sensato ignorar, let it be, go with the flow, o último que feche a porta. alimentar dramas é uma cena que não me assiste.

concluí, cerca de um mês depois, que sou uma miúda muito sensata (e muito egoísta por conseguir pensar na minha sensatez perante o dantesco cenário que se sucedeu...).

nada me faria pensar que, passado pouco mais de um mês de ter cortado relações comigo, o rapaz fosse passar-se da cabeça e decidir que estava a ser perseguido e que o queriam matar. decidir, sim, porque quando não estamos a falar de factos as coisas têm de ser bem pensadas (a palavra "bem" não será a mais apropriada para aplicar neste contexto, mas por "bem" quero dizer "muito".) e tomadas as respectivas decisões. (a parte de eu ser egoísta começa aqui, porque fiquei mesmo aliviada quando analisei as coisas e percebi que, felizmente, ignorei o drama e evitei meter-me em confusões.)

então, um dia o rapaz acordou e decidiu que estava a ser perseguido e que alguém o queria matar. mas não era um "alguém" qualquer, ele também já tinha decidido que esse "alguém" era uma pessoa que trabalhava na mesma empresa que ele e que morava no mesmo complexo habitacional. mal saiu de casa decidiu que precisava, a custo da própria vida, de apresentar queixa desse "alguém" a todos os polícias que encontrasse no caminho e também numa esquadra por onde passou. por várias razões não conseguiu fazê-lo e acabou por rumar ao seu local de trabalho, como fazia habitualmente. mas ali não estava seguro, aquele lugar era perigoso e decidiu que tinha de sair dali para se refugiar noutro sítio. por razões óbvias, a sua casa também não era opção e a sua mente transportou-o até à embaixada portuguesa. sim, ali poderia pedir protecção e, jogando pelo seguro, dizer que tinha de se ir embora para portugal. não tinha trazido o passaporte consigo, mas tinha mesmo de se ir embora, por isso a embaixada que tratasse de "fazer acontecer", porque ele não podia ir a casa busca-lo, era demasiado arriscado. a coisa poderia ter terminado aí mas, para mal dos seus pecados, a empresa mandou dois dos seus colaboradores em seu auxilio, com o intuito de tentar compreender a situação e, de alguma forma, ajudar o rapaz. mas a empresa era cúmplice de tudo (isto sou eu a tentar imaginar o que poderia estar a passar pela cabeça dele...) e ele tinha de se manter afastado de tudo e de todos. provavelmente queriam dar-lhe a volta e leva-lo de volta para o atirarem aos lobos, ele bem sabia que não podia confiar neles, ele via mais à frente. se nem na embaixada estava seguro, bem, o melhor seria esconder-se nalgum sítio e não revelar o seu paradeiro a ninguém.

dito e feito, o rapaz desapareceu. nunca mais foi visto por terras angolanas. sabe-se que viajou para portugal. sabe-se que está de baixa médica e that's it, não se sabe mais nada...